quarta-feira, maio 11

Fátima


Dois dias mais e temos Fátima. Os peregrinos que na semana passada caminhavam em contra-a-mão no asfalto devem estar perto do santuário. Pela minha parte olho a data e quase conto as horas que faltam para que na aldeia se celebre a missa.
Não assistirei, que a cerimónia é longa, cansativa para o incréu amador que sou. Aflige-me também a ignorância que tenho dos momentos em que os fiéis se levantam, depois ajoelham, tornam a levantar. Sermões, responsos, homilias, o recolhimento dos que esperam a comunhão, cada vez que por uma ou outra razão sou obrigado a assistir, sinto que não pertenço.
Irei, sim, à procissão, que devido à idade do pároco se faz agora em volta da igreja e não, como antes, com ida-e-volta ao cemitério velho. Mas depois, ritual que compreendo e aprecio, estarei presente ao "almoço dos padres", banquete que sempre deixava carinhosas recordações de papo cheio e boa conversa. 
Já não deixa. Em volta da mesa somos todos velhos. Não se discutirão carros e qualidades de vinho, as virtudes curativas do uísque, a sabedoria dos alveitares, os tipos de centeio. Vai-se falar de pontadas e viroses, das pílulas azuis que este toma e aquele já tomou, das injecções que ao outro receitaram, de biopsias da próstata, de dores nos joelhos, do mal da gota. Vão-se recordar os falecidos.
Despachada a sobremesa e o copito de vinho fino, o mais idoso benzerá a mesa e levantamo-nos dali com os vagares do reumatismo, fazendo votos para que, mesmo trôpegos e desdentados,  daqui a um ano possamos repetir.