quinta-feira, dezembro 23

A do japonês e a freira

 

Sempre gostei delas, ainda gosto, mas há tempos vi-me a pensar sobre as razões que num grupo, por vezes sem razão aparente, me levavam a contar uma anedota. Falo no passado, porque pus travão no hábito, desde que me apercebi que o impulso vinha menos do desejo de comunicar um chiste, fingindo agudeza do espírito, do que da necessidade de encher um tempo morto na conversa, ou desviar a atenção de um tópico que, por isto ou aquilo, parecia tornar-se melindroso.

Em muitas dessas ocasiões, porém, em vez de bóia de salvação, a anedota apresenta-se como perigoso instrumento. É desagradável constatar que este ou aquele conviva não está à altura da pointe, aqueloutro põe a nu o fraco intelecto, um terceiro reage perigosamente, contando por sua vez uma anedota que nada tem a ver com o assunto. De morte é a boca aberta daqueles a quem o humor escapa, pior ainda a vacuidade de alguns sorrisos.

Depois, hoje em dia, começa você a contar e logo alguém lhe corta a palavra, porque já a leu na internet, conhece até uma versão melhorada, o que se queria um inocente entretém torna-se polémica, adeus boa disposição.

De modo que, inveterado, e uma ou outra vez desastrado contador  de anedotas que fui, hoje em dia remeto-me ao silêncio, e quando alguém anuncia que conhece uma mesmo boa, a do japonês e a freira que detestava peixe, fecho-me em copas. Corra ele o risco de divertir a companhia.