terça-feira, outubro 22

Nótulas (15)


A Literatura ainda não está morta e enterrada, mas em minha opinião para lá caminha, e não vou repetir as causas, porque as sabe de sobra quem por ela se interessa ou dela  (ainda) vive.
Vem isto a propósito de uns colegas cuja produção, singularmente irrelevante, me deixaria indiferente não fosse a aborrecida insistência com que aparecem em vários palcos, e quando não há casa de espectáculos que os acolha inventam eles  umas piruetas de tão enfadonho e estafado engenho que, passado o momento de irritação, involuntariamente causam piedade.
É uma espécie que sempre existiu e continuará a existir, mesmo quando não houver Literatura, pois sob a aparência de escribas são apenas artistas de circo, meros saltimbancos.
Décadas atrás calhou-me conhecer outro, de quem então pintei este retrato:

Ele imita. Desafo­radamente. E com tão pouca arte que nos seus textos, nas suas polémicas, nas suas críticas e artigos, não custa a descobrir onde foi buscar a inspi­ração ou quem lhe serviu de exemplo, tão visíveis são as 'assinatu­ras' na manta de retalhos da sua prosa.
Em nada é original, mas num de­talhe consegue ser consequente: cada página que escreve abarrota de nomes. Nomes de vivos. Esporadicamen­te um morto famoso, que ele trata então com a familia­ridade sobran­ceira que os eleitos usam entre si.
Porque há pouco quem não goste de ver o nome no jornal, essa sua estratégia deu fruto e ele, em questões de Literatu­ra, à força de nomear os outros tornou-se, se não autorid­ade, pelo menos uma presença.
Medo de que alguém o ataque não deve ter, pois há muito está provado que é possível copiar e plagiar impune­mente. Fora disso, os que ele com assiduidade nomeia e incensa, e os que esperam que ele um dia os venha a nomear e a incensar, pronto sairiam a defendê-lo.
Contudo, porque não lhe falta inte­ligência, deve viver em tormento. Quando se arriscou pela primeira vez a entrar no edifício da Literatu­ra, a sua ambição era de um dia subir aos andares de cima. O que é louvável e natural. Mas a falta de talento e de carácter empurraram-no impiedosamente para a cave e lá se mantém. Servente da fama alheia. Talvez com a secreta esperança de um dia chegar a mordomo.