quarta-feira, outubro 30

A força de vontade


Melhor ou pior, uns mais, outros menos, vivemos as histórias que nos contamos, as que mentimos, as que nos ajudam e, por vezes, in extremis  nos salvam.
Infeliz, o que vive sem imaginação, aquele que por horizonte e esperança só tem o que os olhos alcançam. Cego por dentro, tudo lhe parece fronteira, obstáculo, razão de desistência.
Pedro M. não é desses. A findar os cinquenta, trinta de casado, pai, avô, sem aflições ou queixas de maior, possui uma forte certeza: para alcançar basta querer.
Afirma-o em voz alta, e constantemente o pensa desde que conheceu a Rosalia, a extraordinária galega casada com o Abreu.
Entontece ao imaginar o alarve com ela na cama. Entontece na praia. Retesa os músculos, a impedir-se de lhe arrancar o biquíni. Entra no café e logo se dá conta: parece limalha atraída pelo íman.
- Buenos dias, Rosalia.
O desnecessário espanhol usa-o ele como mostra de ternura, e o beijo na face, um nadinha mais longo do que o preciso, é código fácil de decifrar .
Um dia atreve-se. Falarão de livros e vê-a já interessada, curiosa. Para que não fique arisca só depois dirá que o leu no Kamasutra. Nada de erótico, tem mais a ver com uma sensação de calor e alívio, um sentimento de bem-estar.
Tomará um ar sério, quase científico, para dizer que se aplica a unha do indicador num ponto muito preciso da nuca da outra pessoa e, fazendo um mínimo de pressão, raspa-se ligeiramente na vertical. Uns cinco centímetros. O resultado é incrível, o corpo parece levitar, alcança um estado de serenidade que excede de longe o dos exercícios de ioga. Tudo depende, mas por vezes…
Não decidiu como irá continuar, mas uma certeza tem.