quarta-feira, junho 12

Birras

Caro João
Naboukov, que sabia de escrita, torcia o nariz a Finnegans Wake. Há mais, mas a maioria cala-se – que é a linguagem da torre de marfim. Gente de Dublin e Retrato do Artista, ambos bons, mas nada de especial como personagens, história, ou arte de contar.
Li Ulysses, por volta dos vinte e pouco, depois já passados os quarenta. Duas vezes, leitura espaçada, com muito esforço, a segunda foi a mais proveitosa. Anos depois, em voz alta, li vários capítulos ao azar. E de facto a musicalidade surpreendeu-me. Isso foi há mais de cinquenta anos, não voltei nem volto a pegar-lhe.
Vergonha não senti. Descobri, sim, que Joyce tinha um saber da Literatura, dos assuntos da Igreja e da Mitologia, que estavam, e estariam, fora do meu alcance. Finnegans Wake não me dizia nada, pus de parte. No que respeita a Crítica, de muito novo arranjei um "faro" que me protege dos seus pontífices, e ajuda a separar o trigo do jóio.
Cânone? Assunto de eleitos, quando conversam de torre para torre.
Finnegans Wake é caso extremo, mas há muito que me irrita: Neo-Realismo, Nouveau Roman. Se recordo a fama que essa gente teve, e como estão literariamente defuntos, diverte-me que depois de tomar  conhecimento dessas obras alegremente as pus de lado.
Um livro com que (quase) toda a gente se embasbaca, compreende, e com ele se voa para  regiões superiores do espírito, mas não consigo ler até ao fim: Moby Dick. O que prova que a culpa não é do livro, mas do leitor: não posso ter razão contra os milhões de anónimos e os grandes espíritos que o reverenciam.