quinta-feira, junho 30

Luto

Não há ali defunto, mas o ambiente, o postigo que mesmo no dia soalheiro pouca claridade  deixa entrar, as viúvas quatro vultos de luto, agachadas em banquinhos, silenciosas, perdidas no hábito de fitar a lareira apagada.
Não há ali defunto, e Trás-os-Montes não é a Andaluzia, mas na quase escuridão parece que  encenam uma daquelas fotografias com que Josef Koudelka e Edward West souberam mostrar a intensidade e o recolhimento da dor feminina nas terras do Sul.
Quem entra sente-se intruso, hesita em dar as boas-horas, sabe que o desespero fez mais do que torná-las surdas. Sente que o silêncio e os xailes em que se escondem da cabeça aos pés são uma forma de mortalha, um preparo de enterro.
Pousa o embrulho que trouxe e sai, fecha de mansinho a porta, põe as mãos em pala a livrar os olhos da força do Sol. Talvez, também, a proteger-se da visão que teve e quer apagar.