O meu gosto seria
participar em conversas que agudizam o intelecto e os sentimentos, conhecer
daqueles espíritos superiores que, com ciência e sabedoria, explicam a
diversidade das gentes, o presente do mundo, o seu futuro, os mistérios do
Além.
Esse seria o meu gosto. A minha realidade é a do conhecido que, ao entrar no
café, me agarra sussurrando: “Gostei daquela história da gaja e do gato.”
Ao mesmo tempo que me liberto do abraço, sorrio, encolho os ombros, tenho uma
vaga ideia do que quer dizer. Mas já ele avança a informar que também anda a
escrever umas coisas onde trata “de casos interessantes da região, e umas
brincadeiras a respeito dos amigos, da política, certas situações...”
Espero. Vejo-o dar uma piscadela de olho a criar suspense. Embora seja
pouca a clientela quer que nos sentemos ao fundo da sala:
- Pois escrevo umas brincadeiras, e talvez por causa disso tenho encontrado
umas gajas. Quer você saber ...
Salva-me um outro conhecido que entra, e a quem aceno com urgência fingida.
Desculpo-me. Despeço-me. O que chegou, talvez porque começa logo a contar que
foi ao médico, por causa daquela pontada que lhe dá no lado esquerdo, não
estranha o meu modo. Veio para tomar o descafeinado. Com um pastel de nata.
Hábito velho. E um cigarrinho, quando fumava. Felizmente perdeu o vício. Faz
muito mal. Começou aos dez anos. Uma sorte não ter dado cabo dos pulmões. Antes
do almoço ainda vai à farmácia, a ver se lhe aviam a receita dos outros
comprimidos. E tem de passar pelo Sousa, que ontem foi à Espanha buscar
presuntos. A Fermoselle ou a Zamora, não sabe ao certo. Que o Sousa é um bocado
assim, sempre com segredos
- Melhor que o de Lamego. Você gosta de presunto?
Ah! Participar em conversas que agudizam o intelecto, conhecer daqueles
espíritos sábios, superiores...