Para quem passa a vida a escrever ficção, a criar personagens, a compor enredos e peripécias, chega sempre a hora de estranhas descobertas, como a de se perguntar em que medida a sua realidade passa para a fantasia, se a fantasia se torna um mau hábito e distorce a realidade, ou se nada disso é válido mas tudo acaso, à mercê do momento, do estado de espírito, do poder da memória, do cansaço do dia, do fastio de existir.
Seja como for a obrigação manda, porque obrigação é, e se por acaso chega um momento em que o desconsolo pesa demais, porque os diálogos são fracos, o enredo não avança, os personagens uns títeres sem vida, a inveja te sussurra que os outros, todos os outros fazem melhor, são mais capazes, descobres então que a solitude não é um conceito, mas praga que inconscientemente a ti próprio rogas, maldição que te leva à encruzilhada e recusa a escolha do caminho, obrigando-te a seguir em frente quando a tua vontade é parar, esquecer, ir de volta para o mundo real do sangue, suor e lágrimas.