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Astuto, trabalhador incansável, nascido em família
que há gerações, e muito bem, vive do comércio, o meu amigo diz do povo o que
Mafoma não disse do toucinho, e aumenta a dose. O povo é mandrião,
trafulha, ignaro, sorna, medroso, cobarde, vive para comer e fornicar, não tem
espinha dorsal.
Horrores
de Estaline, torturas de Mao, bairros de
lata, fome e miséria, o povo merece tudo isso e mais. Culpa sua.
Com
menos paixão nos argumentos, também eu tenho os meus cavalos de batalha, mas
como me esforço por avaliar prós e contras, tornei-me incapaz de
arrebatamentos, raro vou mais além do
que franzir as sobrancelhas.
Não
me agradaria que pudessem fazer de mim um retrato como o que pinto do meu
amigo, mas tenho-lhe inveja, pois é muito o que me apeteceria desancar, pôr a
nu a desfaçatez, a pulhice, o desdém pelo semelhante, a arrogância dos que se
crêem com poder, os que julgam ter recebido do Alto, e em exclusivo, o que aos
mais é negado.
Infelizmente,
para minha frustração fico-me pelas palavras, que aliás ninguém ouve, porque as
guardo para mim.
O
que é natural, pois também sou do povo.
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Publicado no CM