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Aqui na aldeia, por
volta das seis da manhã vem com o ar um cheiro forte de resina de esteva, pinho,
giesta, à mistura com o sem-número de ervas, musgos, plantas e árvores que
cobrem as ladeiras, ou se escondem na estreitura por onde correm fios de água
que só no Inverno são riachos. Logo depois junta-se-lhe o do fumo acre das
lareiras que se acendem.
Há quase uma
semana anda o tempo soalheiro, e porque assim continuará saem os anciãos a
procurar o quente, fica a rua menos desolada, atenta-se melhor no chilreio da
passarada, na pressa das andorinhas que fazem ninho nos beirais onde lhe
garantem paz e sossego.
Arranja-se tempo
para dois dedos de conversa, trocam-se novidades, fala-se num sussurro deste
caso e daquele, de uma vergonha e doutra, do enterro de ontem, de doenças, de
médicos, do que engancharam em Meirinhos e não vai escapar ao castigo que
merece.
Come-se bem, na
casa do povo, a que umas vezes se chama a associação, ou a casa dos rapazes, onde
agora há um convívio que o tempo frio impede.E na ruína do que foi o casarão
dos meus trisavós, os donos puseram um sólido portão de ferro para que, segundo
corre, não vá algum desalmado vasculhar e descobrir o tesouro que desde o tempo
de Napoleão lá enterraram.
O longe de
antigamente mudou-se num perto, passa um carro, passa um tractor, aqui e ali
ouve-se a televisão, mas nas pessoas como nas casas, nos casebres, nos
palheiros abandonados, nos lagares que já não servem, sente-se algo de
continuidade, espírito de permanência, um misterioso fio que, parentes ou vizinhos,
a todos une.