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É previsível, monótono, pendular: na proximidade do
assalto à manjedoura começam os revelações, os escândalos, os dedos a apontar
para os do outro lado, partido, camarilha, seja o que for. Os outros são os
pulhas sem vergonha, nós os bons e capazes salvadores da Pátria.
Mas o acervo de pulhices, trafulhices, o lavar de roupa suja, só põe de boca aberta
os simples, os que desconhecem a sociedade em que vivem, os que acham cansativo
estudar a interessante, e tantas vezes tristemente cómica, História de
Portugal. Escândalos pequenos e grandes,
roubalheiras grandes e descomunais, corrupção que nem na Bulgária ou no Congo,
tudo nela cansativamente se repete.
Contam-nos agora as peripécias do casal que fez isto e
aquilo, tem isto e mais aquilo, e a
impressão que guardo é a do cansaço de tantas vezes ouvir o mesmo disco.
Tem a senhora um quarto de milhão de euros em roupas no
guarda-fatos? Muitos sacos Hermès a onze mil euros a peça? Nunca gasta menos de
quatrocentos no cabeleireiro? Regala-se o casal com pequenos-almoços de
mil e quinhentos euros (ou serão dólares)?
Que importa? O que é que de facto mudou na nossa
sociedade? O escândalo do casal em questão, os escândalos anteriores e futuros,
os que nos contam e os que ignoramos, não nos virão em linha directa, mas
herdámo-los dos antepassados, que quando vieram ricos da Índia imitaram Nero, ferrando de prata
as suas mulas; andaram depois dois séculos de mão estendida esmolando aqui e
ali; voltaram às ferraduras de prata quando lhes chegou o ouro do Brasil.
Seguiram-se outros dois séculos de penúria e vergonha,
até que nos aproximaram a teta que o senhor Mário Soares aconselhou a chuparmos ao
máximo.
Os que estão perto dela de novo ferram de prata as suas mulas, ou o moderno equivalente. Os outros terão de esperar vez. Onde está a novidade? Qual é a surpresa?
Os que estão perto dela de novo ferram de prata as suas mulas, ou o moderno equivalente. Os outros terão de esperar vez. Onde está a novidade? Qual é a surpresa?