Há um tipo de amizade que nos vem pelas diversas razões da profissão, da vida social, do parentesco, às vezes por encontros fortuitos, e quando julgávamos poder manter confortável distância e algum resguardo do nosso sossego, eis que o amigo carrega no acelerador da afeição.
Chovem convites para festas de aniversário, casamentos, para jantares e reuniões, almoços, conferências, visitas ao Alentejo – "Espectacular, o nosso Alentejo! Conhece?" – montarias, golfe – "Não me diga! Nunca jogou? Excelente para a forma".
A cada mail ou telefonema já não é só a cabeça a reagir com fúria, mas o estômago que faz horas extraordinárias na produção de suco gástrico. Quando não há desculpa possível e nova recusa seria malcriadez, vê-se a gente em tête à tête , sem possibilidade de escape, estende ele as garras do seu ego e tem-nos ali presos, imóveis, embasbacados.
Quanto fala! Quanta coisa sabe! De agriões e vinhas do Douro, energias renováveis, Art Nouveau, Mondriaan, a guerra na Guiné – "Estive lá de 69 a 71. Um inferno, mas uma experiência fascinante."- de chá verde, bolo-rei, da linha do Tua, do preparo da lebre com castanhas…
Comecei a desenhar e confesso que caí no exagero, pois não conheço ninguém que se assemelhe ao retratado. Há, sim, uns três ou quatro que, se os juntasse, dariam um personagem ainda mais cansativo.