Umas vezes por aborrecimento ou cansaço, noutras porque a paciência se esgota, ou então é a cortesia que perde a elasticidade, sobram ocasiões em que, durante uma conversa, a teimosia com que o interlocutor exige atenção leva a uma quase hipnose.
Exceptuando o Silva, que é abrutalhado, de repente levanta-se e nem se despede, nós, mais cordatos. aguentamos as preleções do Cardoso, tanto por amizade, como por sabê-lo adoentado, mas também porque estar connosco o alivia do jugo doméstico que Mafalda aperta quanto pode.
Na “última” sessão começou ele por zombar dos filósofos de meia tigela, esses que sabem das doutrinas mais variadas, afirmando que para tudo há uma idade. A infância para as brincadeiras, na juventude os amores, aos trinta e quarenta tratar da vida, a seguir o declínio, finalmente para os velhos o repouso e a solidão da antecâmara da eternidade.
Continuou ele dizendo que, além de semelhantes afirmações se prestarem a confusão, quem as enuncia tiraria proveito se pensasse duas vezes, olhasse para si próprio, olhasse depois em redor e, cuidadosamente, só então abrisse a boca.
Deve ter sido nesse momento que a minha atenção levantou voo. Porque, mau grado a amizade, é cada vez mais escasso o interesse que tenho em saber o que vai na cabeça do semelhante, que ideia faz ele do mundo, ou quais são as miragens que o divertem. Além disso, vezes demais sou incomodado pelos ingénuos que deslizam alegremente na arrogância da pouca tarimba. A esses desculpo, pois tudo tem o seu tempo e à volta dos dezoito vivi idêntica fase.Hoje, porém, chegado a uma idade que não deixa escolhas, resta-me a nostalgia que outros tão bem exprimiram: "If youth only knew: if age only could!" – (Se a juventude soubesse; se a velhice pudesse!)