quarta-feira, dezembro 14

A arte da conversa

 

Uns gostam, outros suportam-nas com um sorriso e aqueles acenos que demonstram interesse. Os que são como eu ressentem tonturas. Falo daquelas conversas em família e com amigos, quando tudo parece girar em torno do que a avó disse, da doença do tio, do preço da gasolina, de como o almoço estava bom, mesmo bom, mas nada que se compare àquele do ano passado, na Mealhada. Vocês lembram-se? Quando a tia Aurora ao levantar-se da mesa escorregou e partiu a perna? Se fosse hoje...

Aborrecimentos assim fazem-me devanear, enchem-me de inveja de não ter vivido na Viena dos primeiros decénios do século passado, ou na Madrid da mesma época, quando a conversa de café se elevou à qualidade de verdadeira arte.

Comparando o espírito desse tempo com o meu próprio, o da gente que me rodeia, ou as graças tolas que a televisão debita, nem é preciso que chova às bátegas, como neste fim de manhã, para me pôr a olhar para o frasco de Valium com apetites de alcoólico. E vontade de me meter na cama. Com o livro que me fala de homens desse tempo, e onde encontro frases como esta de Ferenc Molnár: “É um mentiroso de tal ordem, que nem o contrário do que ele afirma é verdade”.

Ou esta de Egon Friedell: “Electricidade e magnetismo são aquelas forças da Natureza com que os que nada sabem de electricidade e magnetismo tudo explicam.”