domingo, novembro 13

O compincha

 

Tenho filhas com mais idade, ele quase poderia ser meu neto, mas por razões de simpatia, carinho, ser vizinho desde que a mãe o deu à luz, o Severino há muito me fez seu confidente, compincha e benévolo ouvinte das suas aventuras em busca da companheira ideal para meter a aliança no dedo.

Diz que foi acaso, estava longe, muito longe, de pensar naquilo, mas é fraca desculpa. A verdade lê-se-lhe no sorriso de pecador confesso, e no embrulhado das suas instruções. Tira-me o rato da mão, porque demoro a encontrar o site, clica entusiasmado, dá-me uma cotovelada:

- Aqui!

De seguida, agitado, mal me deixando tempo de ver ou de ler, clica em "Companions". Trava a respiração. Aparece uma série de fotografias em que distingo mulheres, mas o cursor sobe, desce, as imagens confundem-se, até que finalmente anuncia:

- É esta! Na fila da esquerda. A quinta a contar de cima. Denise!

Baba-se em adoração, quase exige que também me babe, repete a cotovelada.

- É linda, não é?

- De facto é.

- Parece-me estrangeira. Tenho ouvido dizer que agora há mais romenas e menos brasileiras porque...

Aceno que sim, escondo que as suas “meninas” nem sequer me são de remoto interesse. Mas amizade é amizade, e tenho simpatia pelo bom-serás que possui uma única caturrice: a da busca da mulher ideal e, como demora a encontrá-la, “ir apanhando o que vem à rede”.

Pergunta agora se a rapariga me recorda alguém que se lhe pareça. A ele também não, tinha perguntado por perguntar. O que quer saber de mim é como sair da indecisão em que o põem as forças contrárias, e por igual poderosas, do cio e da algibeira.

Clica em "Rates" e resmunga: -Quinhentos euros! É dinheiro!

Aceno que sim e lembro-lhe que em quase tudo nos rege a economia do mercado.

Ele clica de novo na fotografia e suspira, tristonho:

- Já tentei, mas não se pode copiar.