À semelhança do detector de mentiras, seria útil que existisse um termómetro das amizades. Um aparelho que lhes medisse a força, a febre, que avisasse quando se aproximam do ponto crítico, do momento em que vão desabrochar, se já alcançaram o topo, se são passageiras ou das que ficam. Enquanto esse invento não chega temos de confiar no que observamos e depender das oscilações do frágil aparelho dos sentimentos. Assim, algumas boas amizades nascem sem razão aparente, enquanto outras, boas e antigas, se acham à mercê duma palavra torta, um sorriso menos caloroso. Há as que definham como a vida dos anciãos e as que, tal uma vela, lentamente se vão apagando . Uma nasce espectacular como a sorte grande, outra finda com os relâmpagos e trovões que se imaginam no Dies Irae.
Será possível contar o número de amizades? Estabelecer, mesmo que aproximadamente, quem é mais amigo, menos amigo? Dizer se, numa escala de cem, certa amizade não passa dos dez, anda pelos vinte e cinco ou está nos oitenta? Anos atrás, quando num inquérito quiseram saber se me assemelhava aos meus amigos, respondi mal-humorado que não tinha amigos. Claro que os tenho. Felizmente. Amigos e amigas. O que não tenho e ainda não há é o termómetro.
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In Pó, Cinza e Recordações – Quetzal, 2015