O meu amigo
André diz, eu repito, e como mais ano menos ano pertencemos ambos à geração
anterior à descoberta da penicilina, fazemos coro nas lamentações, e a maioria
dos nossos encontros às sextas-feiras, um ritual de anos, são marcados pela
mesma tónica: por um lado o espanto que nos causam algumas mudanças, pelo outro
a maneira como os que nasceram depois de nós, não somente parecem ter do mundo
uma visão peculiar, como demonstram que lhes falta o que ambos por facilidade
chamamos bom-senso.
Semanas atrás agitou-se o
mundo com a alarmante novidade de que neste momento nada menos de 1 milhão de espécies
corre o risco de desaparecer, causando incríveis e irremediáveis danos ao
planeta, à espécie humana, aos infindos e frágeis equilíbrios de que nós,
humanos, raro nos damos conta, mas os cientistas constantemente estudam e
analisam, concluindo que o fim está próximo ou, melhor dizendo, que são de
assustar as probabilidades de que o planeta, e nós com ele, acabemos mal.
Para já é esse redondo milhão
de espécies, certinho, sem erro de cálculo. Noutras marés vêm-nos com o gelo
polar a derreter, ou então são as baleias e os golfinhos que se suicidam,
prenunciando o fim de tudo. Para não falarmos de como à força de tão
desmesurado aquecimento a Terra se aparenta a uma panela de pressão que não
tarda a rebentar.
Porque já demasiadas vezes
vimos esse filme e mais vezes ainda, científicos ou leigos, aturámos os sermões
dos fanáticos profetas do Apocalipse, é cavaqueando sobre todos esses maus
prenúncios que o André e eu, com a ingenuidade de que os idosos têm o privilégio,
nos perguntamos o que terá acontecido, não ao planeta, mas na cabeça dos nossos
semelhantes, para que tanto entusiasmo dediquem ao medo e às ameaças, não
queiram ouvir opiniões contrárias, insultem e ostracizem os raros que sem
preconceito, subsídio, ou agenda política, investigam o que há de verdade nos
vários pontos de vista.
Infelizmente, a moda manda, e
assim o proveito e a fama vão para os cabeças do rebanho, que às vezes parecem
mal saídos dos cueiros, mas tudo e mais alguma coisa sabem da poluição, do
calor no Ártico, do fim dos lagartos na Nova-Guiné, e de dedo em riste avisam
que a salvação do planeta e a nossa está nas eólicas e na fé vegan, razão de
sobra para que nos apressemos a ver a luz e a seguir a sua crença.
É então que nós dois, com
muitos anos e vivências de sobra, nos perguntamos: que raio de gente é esta,
sem esperança, que só fala de medos e ameaças?