Houve tempo em que fui saudosista, daquele tipo lamecha que entristece porque o que era já não é, a juventude se perde, os mortos não ressuscitam, as amizades fenecem e a vida não tem marcha atrás.
Não dei conta de como sucedeu, mas quase de um momento para o outro deixei de ter saudades, foi assim a modos de um cortinado que, ao descer, me separasse do passado.
Tal como outros por dieta diminuem o sal e o açúcar, corto eu nas recordações, desligando o ecrã onde, as mais das vezes a ensombrar-me, projectava momentos e memórias.
Já oiço o fado sem que se me humedeçam os olhos, leio a Mensagem com desprendimento, passo indiferente pelas ruas em que vivi, sinto-me constrangido se alguém, conversando, refere um episódio meu.
Corto-me do passado, mas não acho consolação no presente, nem tenho certezas para o futuro. Vou assistindo, mero espectador da minha vida, descontente com o personagem e desinteressado do enredo.