A vida corre como quer, as coisas são o que são, outra verdade não resta: o gajo não é rico!
Para seu bem, e porque usa outra bitola,aprendeu a reconhecer quem vale, frequentou terras várias, gentes de muitas cores e, como que de nascença, recebeu o dom de distinguir o genuíno do pechisbeque, a sinceridade do fingido, o pasmo alheio diverte-o, não lhe faz mossa.
Quando lhe dá para desbobinar o filme da sua vida, o próprio fica de boca aberta, pois aquilo não são episódios do Rin-Tin-Tin mas vivências do real com um gráfico estonteante como o das grandes febres.
Ninguém acreditará, mas isso é supérfluo: teve a fortuna à mão, mais de uma vez lha ofereceram de bandeja, mas feitas as contas e visto o resultado, o que aquilo ia implicar de cumplicidades, compinchiches, obediências, subserviências e genuflexões, agradeceu, ficou-se pela mediania.
Para ser livre como os pardais só lhe falta voar. Tem amizades, amores, carinhos, uma família de gente boa e laços fortes. Desconhece grilhões ou grilhetas, caminha de cabeça levantada, não deve, não teme, dispensa favores, jeitos ou arranjos. Respeita a todos e a todos trata por igual, cuidando que alguns não cheguem perto, porque a natureza lhes manda morder.
Não lho dizem de caras, que a mesquinhice, a inveja, o medo e a ignorância doutros mundos assim manda, mas sussurram-no perplexos entre si: "Pode ser que tenha alguma coisa, mas não se vê!"
Uma certeza possuem que lhes é de grande conforto, lhes dá o gozo de olhar de alto e esquecer a própria miséria: o gajo não é rico!