Vêem-se uns já no Maio 68, sonham outros com nova Abrilada, mas tudo aquilo é filme e festa, arraial de cegos que preferem não ver, manif das boas para discutir no café depois de almoço com os argumentos da ignorância.
Desobediência civil? Será preciso repetir-lhes que não leva a parte nenhuma? Que acabam sempre por vencer os que têm na mão a faca, o queijo e o prato onde isso se serve? E que o voto é miragem?
Foi grande a festa, a paulada será em proporção. O pesadelo veio para ficar, porque o país continuará a ser de desigualdades medievais, corrupto nos órgãos de governo e controlo, corrupto também na mentalidade do jeito, da cunha, da subservência, do favor e do clientelismo.
Em vez de sair à rua para o inútil folclore do protesto, ou ficar em casa a remoer a sua impotência, melhor seria que cada um deitasse contas àquilo que como cidadão aceita ou definitivamente recusa.
Essa, sim, essa é a escolha difícil, fundamental. Improvável, também, no Portugal que os portugueses ao longo das últimas décadas transformaram num teatro de irrealidade e fantochada. Escolha que se faz no íntimo, não na praça pública.