Surpreende-me sempre o feitiço que a palavra Amsterdam exerce em certas pessoas. Vivendo elas longe e sabendo-me aqui, algumas como que endoidecem a imaginar as festas a que irei, a gente interessante que devo conhecer, os acontecimentos em que tomo parte, os museus, os concertos, os teatros, os cafés...
Se vêm de visita e partilham uns dias a minha realidade, recusam acreditar que eu de facto viva entre as quatro paredes do meu quarto de trabalho. Sorriem, desconfiados, achando que deve ser pose. E nem a minha idade levam em conta. Assim que voltarem as costas eu de certeza recomeço a ir às festas, aos cafés...
domingo, junho 24
sexta-feira, junho 22
Ernestina
Mandou o Destino que, poucos dias passados, eu regressasse ao lugar donde partira.
Ernestina (1912-2007) faleceu ontem, enterra-se hoje.
Mãe de um só filho, a sua vida, que foi uma de tristeza, amargura e terrível solidão, dava um livro. Escrevi-lho eu. E a sua morte quebra o último elo carnal que me ligava à terra onde nasci. Felizmente são ainda muitos e fortes os laços que a ela me prendem.
Ernestina (1912-2007) faleceu ontem, enterra-se hoje.
Mãe de um só filho, a sua vida, que foi uma de tristeza, amargura e terrível solidão, dava um livro. Escrevi-lho eu. E a sua morte quebra o último elo carnal que me ligava à terra onde nasci. Felizmente são ainda muitos e fortes os laços que a ela me prendem.
quarta-feira, junho 20
Solidariedade
No primeiro dia de escola, em meados de Outubro de 1939, a professora rezou connosco em voz alta um padre-nosso, e depois teve-nos ali perfilados e quietos, num minuto de silêncio “pela gente que sofria com a guerra.”
Nem ingleses, nem franceses, alemães, judeus, polacos ou russos. Simplesmente, como com gravidade disse, pela gente que sofria. E eu poucas vezes voltei a sentir um calor de solidariedade que se comparasse ao que conheci nesse momento dos meus nove anos.
Nem ingleses, nem franceses, alemães, judeus, polacos ou russos. Simplesmente, como com gravidade disse, pela gente que sofria. E eu poucas vezes voltei a sentir um calor de solidariedade que se comparasse ao que conheci nesse momento dos meus nove anos.
terça-feira, junho 19
quinta-feira, junho 14
Intervalo
A loja fecha cerca de uma semana, enquanto a barca levanta âncora e zarpa para as bandas do Mar do Norte.
segunda-feira, junho 11
Andorinhas
Pareceu-me daquelas histórias que se contam ao almoço e, fazendo rir, ajudam a boa disposição. Mas demasiado absurda para ser verdade. Razão porque ontem, para confirmar, voltei à casa do Manuel Barroco.
Escultor de talento, homem de gosto, bon-vivant, narrador capaz, sério quando é preciso, o meu amigo explora em Quintas das Quebradas , aqui ao pé, um excelente “Turismo Rural”.
Hospeda lá as gentes mais variadas, boa percentagem dela citadinos em busca de ar puro e desejosos de, com os próprios olhos, verificar se os transmontanos ainda vestem burel.
O casalinho, à volta dos trinta, logo na primeira manhã apareceu equipado como manda a moda quando se vai em expedição: botas de monte, calções, mochila, binóculo, Ixus, cantil, etc…
O Manuel encontrou-os junto da piscina, prontos para a marcha, e deu-lhes cortesmente os bons-dias, acrescentando qualquer coisa sobre o azul do céu e a promessa de muito calor.
As andorinhas desciam em voo rasante a beber ou a apanhar os insectos que boiavam na água, e foi aí que a jovem, sorrindo como quem se desculpa da curiosidade, disparou a extraordinária pergunta:
- Estes pássaros são seus?
O Manuel hesitou meio segundo, imaginando gracejo, mas a jovem “lesvoeta” queria realmente saber, e ele concedeu:
- São, são! Tenho-os numa gaiola atrás do muro.
-----------------
Para que conste: www.casadasquintas.com . O copyright de “lesvoeta” é do Luís Alves, que também dá por Luís de Boticas.
Escultor de talento, homem de gosto, bon-vivant, narrador capaz, sério quando é preciso, o meu amigo explora em Quintas das Quebradas , aqui ao pé, um excelente “Turismo Rural”.
Hospeda lá as gentes mais variadas, boa percentagem dela citadinos em busca de ar puro e desejosos de, com os próprios olhos, verificar se os transmontanos ainda vestem burel.
O casalinho, à volta dos trinta, logo na primeira manhã apareceu equipado como manda a moda quando se vai em expedição: botas de monte, calções, mochila, binóculo, Ixus, cantil, etc…
O Manuel encontrou-os junto da piscina, prontos para a marcha, e deu-lhes cortesmente os bons-dias, acrescentando qualquer coisa sobre o azul do céu e a promessa de muito calor.
As andorinhas desciam em voo rasante a beber ou a apanhar os insectos que boiavam na água, e foi aí que a jovem, sorrindo como quem se desculpa da curiosidade, disparou a extraordinária pergunta:
- Estes pássaros são seus?
O Manuel hesitou meio segundo, imaginando gracejo, mas a jovem “lesvoeta” queria realmente saber, e ele concedeu:
- São, são! Tenho-os numa gaiola atrás do muro.
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Para que conste: www.casadasquintas.com . O copyright de “lesvoeta” é do Luís Alves, que também dá por Luís de Boticas.
sábado, junho 2
O Além?
A manhã está linda, soalheira, mas de pouco adianta, nem é isso que trava o meu desordenado pensar.
Pressa de morrer não tenho, e tanto quanto julgo conhecer-me é-me alheia a tendência para o suicídio, mas uma vez por outra dá-me um certo frémito de curiosidade de, se porventura nele algo existe, saber como será o Além.
Em paraísos de huris libidinosas ou anjos a tocar harpa nunca consegui acreditar. Tãopouco nos infernos onde o Diabo se entretêm a grelhar os infiéis. Mas teremos uma consciência depois da morte? Uma forma? Será que o esforço que fazemos para aprender, para melhorar, conhecer, criar, construir, progredir, nada é, nada importa, e desaparecerá connosco num infinito vazio?
Pressa de morrer não tenho, e tanto quanto julgo conhecer-me é-me alheia a tendência para o suicídio, mas uma vez por outra dá-me um certo frémito de curiosidade de, se porventura nele algo existe, saber como será o Além.
Em paraísos de huris libidinosas ou anjos a tocar harpa nunca consegui acreditar. Tãopouco nos infernos onde o Diabo se entretêm a grelhar os infiéis. Mas teremos uma consciência depois da morte? Uma forma? Será que o esforço que fazemos para aprender, para melhorar, conhecer, criar, construir, progredir, nada é, nada importa, e desaparecerá connosco num infinito vazio?