terça-feira, fevereiro 12

De que lado sopra o vento



De que lado sopra o vento?

Sabem-no muitos, sei-o eu também por experiência própria e nem sempre agradável, que nisto da escrita o mais cómodo é criar personagens, deixar com eles a responsabilidade das opiniões, das diferenças e dos princípios, de maneira a que seja nos seus ficcionados lombos que caiam as pancadas, recebam eles os insultos, e o autor continue imune, em sossego no seu canto, a salvo dos bandos que, politica e socialmente correctos, moralmente justos, climaticamente empenhados, detêm o monopólio das várias purezas e sonham com ‘campos de reeducação’ para os que ainda comem hambúrgueres, se mostram indiferentes a que os polos derretam e as fábricas despejem mais dióxido de carbono.
Os bem-pensantes, que tudo julgam a partir das suas zonas de conforto, condenarão  semelhante procedimento como uma abjecta cobardia, o que se lhes desculpa. Da minha parte, chegando a esse ponto, mostraria senso comum e um mais apurado sentido da realidade se inventasse então um qualquer Zé Maria, pondo-lhe na boca e dizendo que nasciam no seu cérebro as raivas, as amarguras, as desilusões e mágoas que tantas vezes atormentam o meu dia-a-dia.
Infelizmente, nada na vida é simples, como também é pouco o que podemos prever, o que conseguimos evitar e, para mal nosso, menos ainda aquilo para que encontramos remédio. Do mesmo modo não é para qualquer saber escapar por entre os pingos da chuva.
Jovens ainda, carecidos de experiência, acreditam muitos que os anos trazem sabedoria,  discernimento, paz e equilíbrio. Assim fosse, assim não é. A muita idade e as várias andanças, incluindo nestas últimas um ou outro momento de euforia, os pontapés do Destino, os dos semelhantes, e os trambolhões que por descuido ou tolice se dão, pouco ajudam a compreender da vida. No melhor poderão impedir que se repita um ou outro transtorno, mas a vida, feliz ou infelizmente, é caminho para o qual não há bússola nem mapa.
Vamos andando, paramos aqui e ali, derrapamos nas curvas, caímos na valeta, fazemos o possível por ir direitos e a direito. Depois, cansaço ou susto de ver a meta perto, abrandamos o passo, criando nos que ainda vêm longe a ilusão de que conseguimos chegar até ali por sabedoria e esperteza.
Na verdade, porém, não escolhemos a rota, nem sequer vamos pelo próprio pé: somos empurrados. A uns leva-nos a aragem, a outros o ciclone, a muitos falta a força para içar as velas e, desatinados, enfrentam a tempestade.
Saber da vida? Nem sequer sabemos donde vem o vento ou quem o sopra.