quinta-feira, junho 16

Impossível contar

(Clique)
São boas histórias, mas impossíveis de contar, logo iriam reconhecer Fulano e Sicrano, o filho da outra, a que dizem que fez isto, aquilo, dormiu com o pai, vai casar pela quarta vez.
Deste fazia-se um bom retrato, anotando a voz fininha, a moleza do aperto de mão, o jeito de desviar os olhos, a fama de pedreiro-livre, o arrastar dos pés a parecer que lhe faltam os joelhos.
Àqueloutro há anos que se lhe dão poucos dias, macerado como é o seu aspecto de defunto, as faces escaveiradas e febre nos olhos, os lábios amarelados pela bílis raivosa que ao mesmo tempo lhe escapa da vesícula, do coração e pelos cantos da boca.
No rosto desta anciã lê-se a inveja em estado puro, irracional, venenosa que nem cuspe de víbora, fatal no contacto. Ao sair da igreja ainda vem de mãos postas, o olhar vesgo é que a trai, quem a cruza muda instintivamente de passeio e esconde no bolso a figa que faz com os dedos.