terça-feira, outubro 13

Loas ao campo


Querer ir em busca das raízes, idealizar a vida do campo, descobrir na aldeia o que lá não está nem nunca esteve, ver o que ela não é e nunca foi...
Compreendo bem o desejo, o sonho, o romantismo, a necessidade de idealizar, mas passada certa idade, e não pondo neles algum freio, há entusiasmos que descambam para a obsessão.
Tal como a bizarria do traje e o gosto do rock, o que de bom grado se aceita e desculpa na juventude parece descabido na meia idade. Pelo menos a mim parece. E assim, rabugento, cheio de incompreensão, amuo ao ver que tanta gente canta loas em poesia e prosa a um viver que foi duro e agora é morte lenta.
Não são dois
yuppies a restaurar casebres em Aguadas de Baixo, ou um pianista reformado a pôr painéis solares num turismo rural do Alentejo que viram a maré. Um spa no alto do monte e um hotel de cinco estrelas no Douro ainda menos, que esses são jaqueta emprestada em corpo de pedinte.
Quem neste tempo sente a febre de, em prosa ou verso, romancear a aldeia, romancear a vindima e a matança, o forno onde há muito ninguém coze pão, a escola sem crianças, as casas em ruínas, bem fará em perguntar-se que mola oculta o leva a iludir-se, a cantar, a não querer ver com olhos de ver.
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A fotografia mostra La Vereda em Guadalajara, mas sei-as nossas assim abandonadas e mais tristes, mas menos fotogénicas.